sexta-feira, 31 de agosto de 2007

Era Paulo influenciado pelo Gnosticismo?

Acreditar que o apóstolo Paulo seja influenciado pelo pensamento helênico, do ponto de vista ideológico, e pelo pensamento judaico-farisaico, do ponto de vista religioso, parece-me estar alicerçado numa pré-Concepção de índole liberal que privilegia – sob um determinado aspecto – o determinismo naturalista. Ou seja, Paulo não poderia deixar de ser influenciado pelo Zeitgeist em que estava inserido.
O credo liberal prossegue: na medida em que todos os setores da existência humana trazem como um traço distintivo as influências determinantes do contexto social, conscientes ou inconscientes, sobre a singularidade existencial de um indivíduo, por que não aceitarmos como sendo razoável a opinião de que Paulo apresente em seus ensinamentos algo no âmbito gnosio-lógico que seja o resíduo do gnosticismo grego? Se acreditarmos que os dados do Sitz im Leben – fornecidos pela Historiografia – em que Paulo produziu seus ensinamentos correspondem à Realidade, a resposta parece simples. Se, porém, questionarmos os critérios adotados pela Metodologia Crítico-Historiográfica, a resposta merece, no mínimo, uma suspensão céptica, porquanto é extremamente questionável a suposta neutralidade da objetividade científica em qualquer domínio do saber.
Parece-me ser mais razoável reconhecer que a gnosis grega, através de suas duas vertentes: a mística e a racional, não encontra em Paulo um espaço de atuação, porquanto está associada a uma concepção de que a soteria depende da gnosis do mundo divino, que só poderia ser propiciada através da iniciação. Na doutrina de Paulo, Cristo é a gnosis tou Theou dissociada da gnosis tou kósmou. Dissociação esta que, opondo-se à crença de que a iniciação aos mistérios gnósticos seja um meio de salvação, atribui a Cristo – não à gnosis – o poder soteriológico. A soteria a que Paulo se refere encontra somente em Cristo sua razão de Ser. A gnosis dos gnósticos não pode conferir, segundo Paulo, a graça redentora, pois pressupõe a necessidade de ritos de penitencia como instrumento de disciplina do espírito, ancorando-se fragilmente em uma pistis estranha à pistis tõ Khristõ...
Acreditar que Paulo seja influenciado pelo gnosticismo grego parece ser a conseqüência lógica da crença liberal, que atribui, de certo modo, à Metodologia Crítico-Historiográfica um estatuto de validade inquestionável, o qual propicia, segundo as inclinações idiossincrásicas do sujeito cognoscente, conclusões, crenças, teses, hipóteses ou opiniões que, na melhor das hipóteses, talvez se aproximem da Realidade. Conclusões, crenças, teses, hipóteses ou opiniões devem – historiográfica e criticamente também – corresponder às suas próprias definições. Caso contrário, corre[re]mos o risco de ter a Metodologia Crítico-Historiográfica como um objeto de fé. Nesse sentido, seu cânone de instrumento dogmático para tentativa de controle das Sagradas Escrituras será pelo menos indiferente, para não dizer adverso, à idéia de que Paulo rejeita a doutrina gnosticista.

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